Conheci seu Nenga, sertanejo
da Bahia. Homem simples e de muitas histórias, típico dos Nordestinos. Chapéu surrado, bota velha e empoeirada,
facão na cintura e calça rasgada no joelho. Sua aparência quando calado é rude,
mas quando começa a falar se torna
singela e gentil. Até hoje não sei dizer a idade dele, já tentei adivinhar, eu
acho que é por volta dos 63.
Quando estendeu a mão para me cumprimentar, na porteira da sua propriedade, deu para sentir a mão seca e calejada dos anos de trabalho pesado no chão duro e seco do sertão.
Quando estendeu a mão para me cumprimentar, na porteira da sua propriedade, deu para sentir a mão seca e calejada dos anos de trabalho pesado no chão duro e seco do sertão.
Gosta de puxar assunto e falar do passado. Fala apontando para todos os lados, como se eu soubesse tudo o que existe na região e quem são as pessoas de quem fala. Homem de bom coração.
Conheci seu Nenga em uma viagem pelo sertão da Bahia.
Fui conhecer a sua pequena propriedade, que ele com orgulho diz ter documento e tudo. Seu Nenga diz que aquele é o seu pedaço de chão e que foi o bom Deus que deu para ele.
No seu pedaço de chão foi instalada uma bomba d’água elétrica e uma cisterna para ajudar toda a comunidade local. Foi um projeto de ajuda privada, que envolveu várias pessoas e empresas. Fui entrevistar seu Nenga e fotografar o local.
Perguntei para seu Nenga: – O que o senhor cria por aqui?
Ele me respondeu debruçado na manivela da bomba d’água: – Umas cabrinhas prá leite, umas galinhas prá ovos, tenho um jegue velho pra carregar lenha e um punhado de pé de feijão lá trás na roça.
Continuei com mais uma pergunta: - Essa bomba d’água tem ajudado as famílias da região? – Vixi, se tem, doutô! As crianças tão com mais saúde.
Assim eu continuei com mais algumas perguntas, até chegar a última e terminar a minha visita. A resposta de seu Nenga demonstrou todo afeto e simplicidade daquele coração. A pergunta foi: – Seu Nenga: Quais são seus sonhos?
A sua resposta foi maravilhosa. Ele em um gesto de reverência tira o chapéu da cabeça, o aperta no peito e com um olhar para o céu diz: – Olha meu filho, eu tenho sonhado muito com a minha “véia” que já se foi há dez anos, quase sempre sonho com ela.
Eu não reformulei a pergunta e conclui com essa resposta simples e do entendimento do seu Nenga.
Voltei com fotos, algumas respostas, mas, acima de tudo, voltei com algo que chamou muito a minha atenção e que me colocou para pensar a respeito de sonho, ou melhor, sonhos.
O sonho pode ter três significados totalmente diferentes. Primeiro, o sonho pode ser um doce da padaria (que é muito bom, mas que não vem ao caso), segundo, pode ser um forte desejo a respeito de coisas futuras (que era a minha intenção ao fazer a pergunta) e terceiro, podem ser as imagens produzidas pela mente durante o sono (que foi o que o seu Nenga entendeu).
Nossos sonhos e ambições muitas vezes se resumem em desejos de ter o conforto, o progresso, melhora na qualidade de vida e tudo mais para o futuro (que não é errado) mas, nos esquecemos daquilo que os sonhos nos fazem lembrar o que vivemos no passado, com quem vivemos as lembranças e recordações.
Enquanto eu esperava uma resposta visando o futuro e o progresso que aquela bomba d’água trouxe a comunidade, recebi uma resposta nostálgica, remetendo ao passado e uma saudade.
Ao lado da bomba percebi o quanto o sonho pode ser importante para o futuro, nos levando a uma visão, mas o quanto ele é importante no passado também nós levando a uma recordação.
Guardo a foto do Seu Nenga com muito carinho. Guardo também com carinho os meus sonhos.
Autoria do Texto: Carlos Barabás
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